
INTRODUÇÃO
Na já longa história da melhoria contínua e do Lean, muitas das ferramentas e, por consequência, muitos dos exemplos conhecidos são provenientes de operações industriais. De facto, devido à sua importância e impacto em empresas industriais, os processos que fazem parte do que habitualmente se designa por Operações (por exemplo Produção, Logística, Manutenção, Qualidade) são alvo de análise, medição e melhoria constantes. Por outro lado, noutros departamentos e funções há muitos outros processos que, pela sua natureza, não têm, normalmente, tanta visibilidade. O que não quer dizer que não representem uma fatia importante dos custos e que não tenham potencial de melhoria.

Tal como nos seus congéneres na produção, há múltiplos exemplos de tarefas sem valor acrescentado nos processos transacionais. Fazendo um paralelo com a conhecida lista dos 7 Mudas do Sistema de Produção Toyota, podemos identificar os seguintes:
Processos de produção | Processos transacionais | |
Produção em Excesso | Produzir mais do que o necessário ou antes do momento em que é necessário | Fazer relatórios que ninguém lê Produzir informação supérflua ou com demasiada antecedência Fazer cópias extra Comprar licenças de software em maior número do que o necessário |
Stock | Produto ou matérias-primas paradas no processo | Informação à espera de ser processada Consumíveis Processos em curso (encomendas, projetos, reclamações) |
Transporte | Movimento de materiais e produtos entre operações | Transferência de informação entre operações ou intervenientes Deslocações para levar/recolher documentos, informação, assinaturas |
Espera | Tempo em que os colaboradores presentes no posto de trabalho, mas em que, por algum motivo, não podem executar as operações | |
Processo | Duplicidade de operações no mesmo processo | Usar software inapropriado Utilizar formulários com informação duplicada ou redundante; CC nos emails Excesso de aprovações Transferir informação de um sistema para outro “Aperfeiçoamento” de uma comunicação ou apresentação interna Utilização de registos individuais vs. sistema informático |
Movimento | Deslocações dos colaboradores devido à forma como o processo está organizado | |
Não Qualidade | Produto que não está de acordo com as especificações | Erros (faturação; processamento salários…) Perda de informação Informação tardia Informação incompleta Informação ilegível |
Apresentamos, de seguida, uma proposta de abordagem à melhoria deste tipo de processos.
LEAN EM PROCESSOS TRANSACIONAIS
Os conceitos e ferramentas Lean são aplicáveis a qualquer processo. Tendo claros os conceitos, é, apesar de tudo, necessária alguma adaptação para os aplicar aos processos transacionais, devido a algumas das suas características:
Não são tão facilmente observáveis como os processos de produção
Os colaboradores desempenham diferentes atividades ao longo do dia/semana
Certos processos transacionais são bastante longos (por exemplo um processo de desenvolvimento de produto), o que obriga a obter dados de forma diferente
Têm, muitas vezes fluxos complexos com informação a circular em diferentes sentidos
Junta-se a isto o facto de não ser tão simples ou evidente aplicar diretamente as ferramentas Lean normalizadas há mais tempo e mais conhecidas, como os 5S, SMED, Melhoria de Fluxo, Fluxo puxado.
Torna-se assim necessário dispor de uma ferramenta que nos permita caracterizar a situação atual em termos de fluxos bem como em termos de dados e indicadores, antes de iniciar a aplicação de ferramentas Lean.
MAPEAMENTO DO PROCESSO - SWIMLANE
Não sendo a única forma de mapear um processo transacional, o mapeamento Swimlane tem vindo a ser utilizado, com sucesso, em muitas atividades de melhoria. O seu nome deve-se à semelhança com as pistas de uma piscina, sendo que cada uma delas representa uma função interveniente no processo.

Esta ferramenta permite retratar o processo de forma global, tendo em conta todas as atividades necessárias à satisfação de uma solicitação do cliente. Este exercício de mapeamento é um trabalho de equipa, que reúna o conhecimento das diferentes etapas do processo.
Este trabalho de equipa permite construir uma visão global do processo que passa a ser partilhada por todos os intervenientes, que rompe com as visões individuais, em que cada um conhece apenas a sua parte e não tem a exata noção do impacto do que faz na performance do processo e nas outras atividades.
De seguida apresentamos um exemplo simplificado do resultado de uma atividade de mapeamento, neste caso de um processo de pedidos de manutenção em edifícios:

Desta análise extraem-se, tipicamente, os seguintes indicadores:
Tempo de processo: somatório do tempo de execução das atividades, neste caso 49,4 minutos
Tempos de espera: somatório das esperas (informação que aguarda processamento), neste caso 47,9 dias.
Lead Time do Processo: tempo que passa desde a solicitação inicial até ao final do processo (no caso deste exemplo, Faturação) = 47,9 dias + 49,4 minutos
Com base no mapa da situação atual e nos dados recolhidos, é possível fazer uma primeira identificação do desperdício do processo. De seguida apresentamos algumas perguntas chave para esta análise:
Trabalho duplicado: A mesma atividade é repetida em pontos diferentes do processo?
Esperas: Quais os pontos do processo com maior tempo de espera?
Lead-time: O lead-time do processo é aceitável, ou os clientes acham-no demasiado longo?
Elevada percentagem de questões: Em que pontos uma elevada percentagem de questões/dúvidas impede a realização das atividades de valor acrescentado?
Problemas de qualidade: Existem pontos do processo com elevada taxa de erros?
Trabalho em paralelo: Onde é possível reduzir o lead-time do processo através da execução de tarefas em paralelo?
Após esta análise pode também ser necessário analisar com mais detalhe as tarefas dentro de cada atividade, qual a sua duração e classifica-las (Valor Acrescentado (VA) ou Desperdício):

A partir desta análise é necessário pensar como eliminar ou reduzir os desperdícios identificados:

O passo seguinte, depois de identificadas e caracterizadas estas oportunidades de melhoria, é selecionar aquelas a implementar, em função do seu impacto e esforço de implementação. O processo resultante da implementação dessas melhorias é representado no mapa do estado futuro:

A implementação das melhorias permite o seguinte impacto nos indicadores:
Tempo de processo: de 49,4 minutos para 45 min
Tempos de espera: de 47,9 dias para 17,4 dias
Lead Time do Processo: aproximadamente 17,5 dias
A seguinte etapa desta abordagem é a elaboração de um plano com todas as ações necessária à implementação do estado futuro do processo, qual a sequência, quais as datas de implementação e quem são os responsáveis de cada uma.
EM SÍNTESE
Uma vez que os princípios Lean foram desenvolvidos e inicialmente aplicados em processos industriais, é necessário ajustar o ponto de vista de forma a aplicá-los noutros contextos. Como noutros casos, também aqui é mais importante encontrar formas de entender o processo, mais do identificar que ferramenta utilizar. Também por isso nos pareceu mais importante apresentar uma forma de entender o processo do que dar exemplos de aplicação dos 5S e do SMED a processos transacionais.
Se entendermos bem o processo e se as necessidades do cliente estiverem bem caracterizadas é possível com o método apresentado identificar atividades sem valor acrescentado e, por conseguinte, trabalhar na melhoria do processo e melhorar a sua eficiência, qualquer que seja o negócio e a localização geográfica.
REFERÊNCIAS
John Bicheno
“The Service Systems Toolbox”
PICSIE Books, 2008
ISBN: 978-0-9568307-0-8
“The Lean Office – Collected Practices and Cases”
Productivity Press, 2005
ISBN: 1-56327-316-0
James Womack and Daniel Jones
“Lean Solutions”
Simon&Schuster, 2005
ISBN 0-7432-7595-0
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